terça-feira, 26 de junho de 2012

DEMOCRACIA PARAGUAIA - Lucas Machado


Democracia paraguaia

Logo no país ao lado a fetichização do poder, como diria o filósofo argentino radicado no México, Enrique Dussel, em sua Tese 5[1] sobre a política, a potestas (poder institucionalizado) toma conta do poder político e fetichizando-o aniquila o potencial transformador originário, vontade da potentia (povo).

Fazendo a leitura dessa tese nos remetemos aos acontecimentos que estão rotineiramente no caminho político após o circo eleitoral tradicional, midiático, hilário... somos levados acreditar que a funcionalidade do sistema é essa mesma, se elege para representar, logo o representante e seus atos têm a manifestação da vontade do “povo”, generalidade abstrata e ridícula de um discurso pobre e que arrogantemente nos é enfiado goela abaixo como uma verdade repetida repentinamente.

Quando a potentia (povo) se rebela nas ruas na forma de movimentos populares contra a usurpação da sua vontade pelo poder constituído (democraticamente pelo voto), verdadeiro momento de transição ao horizonte utópico da transformação.. insurge o discurso jurídico-formal para repressão e reprovação de qualquer ato que não esteja dentro do “Estado Democrático de Direito” e da “Boa ordem”, ou diríamos “Estado Despótico de Direito”. Não faltam argumentos (maioria deles jurídicos) em defesa da potestas fetichizada (democracia representativa) para desligitimar a verdadeira manifestação democrática nas ruas, afinal se seu poder já esta representado não há necessidade da população desorganizar a ordem para interferir no nobre ofício político dos parlamentares, está na lei! manifestação é fora da lei! estamos agindo dentro da legalidade! Vocês fora! estão fora! e quem está fora não fortalece a democracia (fetichizada).

Inverte-se a ideia democrática para lógica hipócrita de um sistema político asqueroso, perde-se o debate profundo da manifestação e dos gritos das ruas, para o “jeitinho” político da teatral cena cotidiana de sessões de “acordos” parlamentares, ilegítimas do ponto de vista a não representar vontade alguma concreta, exceto os interesses partidários legitimados na abstração “interesse do povo”.. que oprimem a real vontade da potentia (povo). Ou seja, a cena democrática atual torna abstrato a ideia da vontade política da potentia ao mesmo tempo em que concretiza a vontade política da potestas, apropriando-se como dono daquilo que não foi lhe dado e sim delegado (fetichização do poder político).

Parece que casualmente no Paraguai a democracia representativa dá mais um belo exemplo da sua insuficiência e esgotamento como paradigma moderno ilusório, mais uma promessa vazia e expectativas minoradas. Surge no contexto político da América Latina um novo conceito “Golpe Democrático”, terminologia controversa em outros tempos, mas que atualmente irrompe na realidade para anunciar que a fetichização política da democracia representativa, é um jogo incoerente de soma zero para o poder popular (potentia dusseliana).

E, por acabar de pensar que estamos bem próximos a novamente entrar nesse modelo democrático falido, preconceituosamente chamado aqui de paraguaio, por que afinal não foram eles que inventaram??

Lucas Machado
Floripa, junho de 2012


Após o amigo Lucas Machado apresentar de ótima forma... em uma escrita no melhor estilo waratiano... ou seja.. com tesão!! que muitas vezes nos é castrada nos discursos acadêmicos, não poderia deixar de trazer uma alternativa, através de uma belíssima entrevista que trata de la teoria juridica de la indignación.! os dejo con BOA!!




[1] Livro de DUSSEL, Enrique. 20 Teses de Política, 1ed. Buenos Aires: Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales – CLACSO; São Paulo: Expressão Popular , 2007.



Um comentário:

  1. Me ocorre varias ideias a partir do seu "desabafo", por exemplo uma reflexão sobre a democracia. Na América Latina, temos realmente uma "democracia representativa"?. Concordo contigo nos argumentos mas discordo da categoria "democracia representativa" Parece-me que é mais "democracia delegativa" visto que, "Quando a potentia (povo) se rebela nas ruas na forma de movimentos populares contra a usurpação da sua vontade pelo poder constituído (democraticamente pelo voto)" se fosse representativa, acataria a vontade do povo não é?
    Nossa democracia é apenas "participativa" na hora das eleições (ainda tenho minhas duvidas a esse respeito, mas em fim) ao votar escolhemos quem irá tomar decisões por nós, depois disso, o povo é simplesmente espectador dos acontecimentos politicos e economicos (isso porque das subjetividades ainda não conseguiram se apropriar inteiramente, -humm é para se pensar também- http://www.youtube.com/watch?v=DkFJE8ZdeG8. Vamos deixar por enquanto, subjetividade para "calle trece")
    Sou a favor da democracia participativa, enfatizo, participativa não esta que temos. Segundo o Gramsci a democracia é necessária para dar um paso à frente rumo a um socialismo e logo à tão desejada "sociedade regulada" ou seja "comunismo". Claro que o italiano, vai colocando todas as complexidades neste processo que eu vou resumir em "formação politica" e re-construção do "senso comum" (conste que Gramsci não reduce a isto, sou eu quem estou simplificando).
    É utopia?, pode ser, mas como acredito no materialismo histórico, logo, acredito que todo o que é construido pode ser re-construido.

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